sexta-feira, 13 de julho de 2007

SALA DE LEITURA
O BAR DO JUCA
Uma crônica de Gaetano Gherardi

Oi!
Espero que todos vocês conheçam o Bar do Juca.
Conhecem sim. É onde , numa mesinha quadrada, em alguns fins de tarde, no máximo, uma vez por semana, vocês devem ter visto um grupinho de amigos conversando do mais e do menos.
É sempre o meu amigo Raimundinho quem orienta os embates e debates.
Não vou dizer se eles tomam esta ou aquela cervejinha, mas os gostos são todos bem parecidos, é cerveja.
Anteontem eu estava junto ao Epaminondas, cientista político nas horas vagas e o Tonhão, quando apareceu o Raimundinho , que tinha um novo amigo para apresentar, melhor dizendo, dois amigos novos.
Raimundinho começou as apresentações:
- Hildebrando é ator, Gherardi, um grande elemento para o filme que você está preparando, e o Julio César Lobão da Silva é um intelectual de antiga fama e que serve de “ intérprete” para o amigo.
- Intérprete? O Hildebrando é estrangeiro?
- Não, não. O Hildebrando precisa de um intérprete – é sempre o Raimundinho explicando – porque tomou uma atitude muita séria. Atropelado, como todos nós, pela enxurrada de siglas que existem e são criadas neste Pais e em outros, ele decidiu que falaria somente em siglas.
- Falar em siglas? Raimundinho ,você já teve um amigo que tomou esta atitude anos atrás. Não se chamava Hildebrando, claro. Que fim levou ?
- Fundou um conjunto de Rock e virou cantor. Voltando ao Hildebrando, ele acha que está se formando um novo idioma: o idioma das siglas e ele quer contribuir para isto.
O Tonhão, sempre muito prático- ele é farmacêutico- animou a conversa:
- Seja bem vindo. Aliás o nosso bem vindo se estende aos dois novos amigos, é claro.
O Hildebrando falou então:
- E.A.A.A.C.
O Julio César se apressou na tradução:
- Eu agradeço a acolhida, companheiros.
Ficamos todos em silencio, até que um barulhão de cadeira arrastada e uma mãozinha levantada bem alta para chamar o Juca apareceu de repente. Era o Faustinho. Antigo do grupo, um quase fundador do mesmo, era quem estava chegando.
Faustinho? Um metro e cincoenta e seis de altura, magro que nem manequim gaúcho, ele insistia no apelido, segundo ele, para não ser confundido com o Faustão, o da TV, é lógico.
Faustinho olhou, melhor dito, encarou os dois “novos” e explodiu:
- Não conheço.
Eu fiz uma pequena intervenção:
- Não por culpa deles e nem sua. São amigos do Raimundinho.
Faustinho se abriu num sorriso e dirigindo-se ao Hildebrando pensou em recuperar a atitude hostil demonstrada.
- E então? Tudo bem com você?
Tranqüilamente, sorrindo, Hildebrando respondeu:
- S.T.B.P.E.
E o Lobão traduziu rápido:
- Sim, tudo bem, por enquanto.
A cara do Faustinho era mesmo para ser eternizada numa foto.
Imóvel. Como quem não estava entendendo nada, e não estava mesmo, ficou olhando para o Hildebrando. Esqueceu até do Juca, que ao lado da mesa, tinha atendido ao chamado de sua mão levantada e que também estava estranhando a cena que presenciara, sem querer.
Raimundinho explicou:
- São meus amigos. Estou apresentando aos outros, hoje. Segundo o Hildebrando, e apontou para o cara que sorriu, dentro de poucos meses todos os idiomas serão transformados em siglas...
Juca concordou, ele sempre concordava com os clientes, e afastando-se deixou claro ao Faustinho que ia atender seu pedido.
- Cervejinha para o Faustinho!
O Raimundinho começou um pequeno discurso, inútil como todos os seus discursinhos:
- Hoje é um dia histórico. Merecerá ser lembrado. Aqui, está sendo lançado um novo idioma. O das siglas. Lembrando a frase de Américo Vespuccio..
Eu interrompi:
- De quem?
- Tanto faz, a frase é importante, se você não pode ir contra, una-se. É mais ou menos assim. Ninguém vai conseguir acabar com as mais de quinze siglas que nascem por dia para definir tudo ou para camuflar muita coisa e então: vamos ajudar, vamos contribuir. O Hildebrando tomou a iniciativa. Vamos nos unir a ele, pelo menos. A minha proposta é: É. U. V. F. D. I.!
Todos ficamos olhando para o Raimundinho, esperando a tradução.
Ele riu e explicou:
- Não precisa se esforçar Julio César Lobão da Silva. É fácil: “ é um verdadeiro festival de idiotices” !
Epaminondas, que não tinha aberto a boca, achou por bem entrar na conversa. E como bom cientista político nas horas vagas, declarou:
- Mas são siglas também que definem impostos, taxas e outras arbitrariedades ou atos legais para desespero dos pequenos empresários, e para os médios e grandes.
Como a conversa estava mudando de rumo... Estava? Resolvemos todos chamar o Juca para dar um reforço substancial com os pasteizinhos que só ele sabe preparar
.