sexta-feira, 13 de julho de 2007

SALA DE LEITURA
CIUME DA SOFÍA
Uma crônica de GAETANO GHERARDI


Helena e Brito são meus amigos há muitos anos. São moços. Um casal muito unido e muito apaixonado. Ambos trabalham e muito. Ela num escritório de assessoria de alto nível e ele é funcionário de uma empresa multinacional ou algo assim. Sei que o trabalho, graças a Deus é muito e o tempo para ficarem juntos, nem tanto.
O que eu não sabia era que Helena é muito ciumenta.
Ciúme de alguma outra mulher?
Helena estava sentada diante de mim, com a cara mais triste do mundo.
- Gherardi, se fosse ciúme por outra mulher, se ele estivesse interessado em outra mulher, eu saberia muito bem como agir e reagir. Mas a paixão dele é uma moto. Uma moto. Ele sempre deu nome para as motos que teve, mas esta mereceu um nome diferente, italiano segundo ele: Sofía! Sofía, você acredita numa coisa destas?
- Dele dar nome para a sua nova moto? Claro. Isso é muito comum.
- Concordo que se fosse só o nome, tudo bem. Já falei para você, aliás, que vamos nos separar?
- Não. Por enquanto estamos falando de uma moto com nome italiano.
- Pois, vamos nos separar!
- Espero que seja por pouco tempo.
- Espero que seja para sempre. Não posso “concorrer” com uma maquina. Não é fácil de entender. Vamos por partes. Um Sábado à tarde, por exemplo. Combinamos de ir ao cinema. Num desse cinema-pipoca que agora é moda em Campinas.
Acho que esqueci de dizer que Helena e Brito vivem em Campinas.
- Cinema-pipoca?
- Claro, é mais cara a pipoca do que o ingresso...Ou quase. Mas não vim até aqui, em Amricana, para falar de cinema ou de pipoca, vim pedir um conselho a um velho amigo.
- Estávamos falando em cinema ou em pipoca?
- Não Gherardi. Estávamos falando que o Brito e eu, nos separaremos. Acho que ele vai voltar para a casa da mãe dele.
- Pois é, vocês brigaram.
- Não. Não brigamos. Apenas a vida em comum é impossível. O cinema é um exemplo. Quinze minutos antes do nosso encontro ele lembrou que tinha uma reunião com uns amigos para organizarem uma viagem com as motos.
- Então é dos amigos que você tem ciúmes.
- Gherardi, tente me compreender. Os amigos são todos fanáticos por motos. É da Sofia, da moto dele, que tenho ciúme. Ela é a causa de todos os nossos desentendimentos. De manhã, ele acorda e primeiro vai ver a moto e depois sobe para me dizer bom dia. Nossos papos, quer dizer os “monólogos” do Brito são sobre histórias de motos fantásticas. Quando eu tento interromper ele logo diz: “ um minutinho só, deixa te contar! ”
- Tenho a impressão que o Brito, esta tentando “incluir a moto” na família.
Helena sorriu.
- Eu acho que você já entendeu a situação e os motivos da separação. Vim buscar um conselho. Para mim a decisão é definitiva, mas para ele, não.
- Eu não sou a pessoa mais indicada para aconselhar alguém, numa situação destas. Mas posso fazer algumas perguntas?
- Claro.
- Você tentou se interessar pela moto? Dividir com ele essa paixão?
- E ele tentou gostar de ir ao cinema comigo? De conversar sobre qualquer outro assunto? Falar em viajar ( não de moto, é claro ). Falar em modas... Sei lá, qualquer assunto que possa me interessar?
- Aí é que está o problema. Falta de dialogo, claro e aberto entre o casal. Supere e Brito vai até esquecer a moto.
Helena olhou bem para a minha cara.
- Posso tentar, Gherardi, posso tentar. Você sabe que ele morava sozinho quando o conheci, não sabe?
- Sei sim.
- Você sabe o por que? A mãe dele, dona Justina, não agüentava a estranha paixão do filho por uma moto que se chamava Rita.